domingo, 29 de abril de 2012

Guantânamo

Na entrada do Campo Delta, há uma placa com os dizeres: “Pela nossa honra somos obrigados a defender a liberdade.” Nada que merecesse maior atenção, não fosse o fato de o local abrigar uma das mais infames prisões já engendradas pela mente humana, o Campo de Detenção da Baía de Guantânamo. A ironia contida na placa remete inevitavelmente a outro dístico, colocado no portão do campo de concentração nazista de Auschwitz, onde judeus eram exterminados em massa: “O trabalho liberta”. 

O objetivo formal desse presídio é o de ensejar um espaço em que os prisioneiros não estejam amparados nem pelas leis de seus países de origem nem pela legislação dos EUA. Para que não sejam enquadrados na Convenção de Genebra, também lhes é negada a condição de prisioneiros de guerra. Ficam, pois, num limbo jurídico em que nada os protege, em franca violação a resoluções da ONU. 

O governo norte-americano se recusa também a ouvir os numerosos apelos de organizações que atuam na defesa dos direitos humanos. 

As centenas de homens que lá estão ou que por lá passaram não são submetidos à acusação formal e não são apresentadas provas de seus crimes; não têm direito a advogado e sequer a julgamento. Muitos vieram de centros de tortura em Bagran e Kandahar, no Afeganistão, e Abu Ghraib, no Iraque. Outros, das dezenas de prisões clandestinas mantidas pelos EUA em diversos países, que formam uma comunidade internacional da barbárie. Invariavelmente, são pintados como monstros terroristas, merecedores de toda a sorte de maus tratos, conforme depoimentos dos soldados Brandon Neely e Terry Holdbrooks, ex-guardas do presídio. 

Cidadão britânico de origem paquistanesa, Moazzam Begg é um modelo vivo das atrocidades a que estão sujeitos os enclausurados de Guantânamo. Detido em Islamabad, Paquistão, em fevereiro de 2002, sob a acusação de pertencer à Al Qaeda, Begg passou inicialmente pela prisão de Bagram, onde militares dos EUA rasparam-lhe os cabelos, encapuzaram-no, amarraram-lhe os pés e as mãos nas costas, aplicaram-lhe socos e chutes, colocaram-no nu, submeteram-no a violências sexuais e simularam torturar sua esposa e filhos em salas contíguas à que ele se encontrava. Presenciou a morte de dois prisioneiros sob tortura. 

Levado a Guantânamo, esteve diariamente submetido a maus tratos, em uma cela medindo 2,40 m x 1,80 m, sem janelas e sem luz natural. Foi libertado em janeiro de 2005, sem que lhe fosse feita qualquer acusação. Ficaram-lhe, indeléveis, as marcas da bestialidade. Casos assim contam-se às centenas. 

Desmoralização 

Ao assumir a presidência dos EUA, em janeiro de 2009, Barak Obama declarou que no prazo de um ano acabaria com a prisão. Para sua maior desmoralização, chegou a assinar o decreto de fechamento do cárcere. Não só deixou de cumprir seu compromisso, como em 31 de dezembro de 2011 assinou outra lei, o chamado “Ato de Autorização da Defesa”, que permite a detenção por tempo ilimitado de pessoas sob suspeita de terrorismo, inclusive cidadãos dos EUA. Isso na terra da liberdade! 

Há duas interpretações para o recuo de Obama, que não são necessariamente excludentes: o poder do presidente dos EUA não é tão absoluto quanto se imagina, pois são os cartéis do petróleo, a indústria militar e as forças armadas que atuam nos bastidores determinando o que pode e o que não pode ser feito pelo império; o anúncio de Obama pretendia, de fato, desmobilizar os movimentos em defesa dos direitos humanos, que denunciavam ativamente a ilegalidade e a violência em Guantânamo. 

O espantoso é que as autoridades estadunidenses escolheram para cenário dessa opressão um território já representativo de outro desrespeito às normas internacionais. Guantânamo foi o butim cobrado pelos EUA, em 1903, para retirar suas tropas de Cuba após a expulsão dos espanhóis. Saiu a decadente potência colonial europeia, entrou o reluzente novo império nas suas primeiras passadas globais. Em acinte à legitimidade, o acordo de cessão da base foi assinado por um governante imposto pelos ianques, em um país sob sua ocupação. 

Mantendo este enclave contra a vontade do povo cubano, o governo estadunidense faz letra morta da Resolução de nº 1514, da ONU, que estabelece ser incompatível com a Carta das Nações Unidas toda tentativa visando destruir total ou parcialmente a unidade nacional e a integridade territorial de um país. 

Sobra, enfim, o fato de que a Base Naval dos EUA em Guantânamo sintetiza com clareza notável o desprendimento com que esse império se dedica a exercitar a prepotência desmedida contra seres humanos e contra nações soberanas. 

Sued Lima: Coronel Aviador Ref. Pesquisador do Obseratório das Nacionalidades


2 comentários:

  1. kra mto bom seu blog!!! ta me ajudando mto nas provas, tem como vc postar sobre as grandes navegações e a passagem do feudalismo para o capitalismo. Vlw
    Parabéns pelo excelente blog.

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